Arquivo do mês: dezembro 2011

Silêncio

Ela não sabia mais o que fazer. Sentou-se no sofá e, olhando pros seu seus próprios pés, falou em voz baixa:
– Olha, não posso ler sua mente pra sempre! Se for assim, não tem nada que eu possa fazer.
Talvez ela precisasse entender que não era culpa dele. Sabe o dom das palavras? Ele não tinha. E o dom dos gestos? Bem, ele sempre fazia o errado…
Olharam-se por algum tempo. Ela torcia para que ele abrisse a boca e falasse algo. Ele temia que ele abrisse a boca e falasse o errado.
Ela levantou e dirigiu-se até a porta.
– Então é isso, né?
Ele abriu a boca, mas não respondeu.
Ela virou e foi embora.
– Eu te amo.

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1460 dias

O celular tocou. Era ela.
Tremiliques surgiram por todo o corpo.
Logo depois de atendê-lo, pôs as mãos no bolso certificando-se de que a carteira e as chaves do carro estavam no local correto.
Mal conseguira responder ao que tinha ouvido.  Suava frio, as pupilas estavam dilatadas e até o estômago doía.
Dirigiu apressadamente mas com cautela, lembrando-se das recomendações ouvidas há minutos atrás: ” Tenha cuidado no caminho.”
Era capaz de sentir o cheiro dela entrando pela janela do carro. A única coisa que passava pela sua cabeça era o quão esperado aquele momento foi e agora ele estava lá, indo em direção ao encontro do tesouro perdido.
Quanto mais próximo do local marcado, mais seu coração batia em um ritmo até então desconhecido.
Há quatro anos ela foi embora e deixou para trás tudo o que poderiam ter sido lindas lembranças. E agora ela estava de volta e queria vê-lo.
Ele estacionou o carro e enfim foi ao tão inesperado encontro.
Avistou-a de costas e suas pernas travaram. Queria fazê-las andar mas elas simplesmente não obedeciam aos comandos. Ela, como que em um passe de mágica virou-se e o viu. Foi andando até onde ele estava e nesse momento as pernas deles começaram a se mexer.
Os olhos se encontraram e sorriram antes dos lábios. As respirações estavam ofegantes ansiando pelo tão esperado encontro.
Chegou o momento: as mãos se entrelaçaram, os braços se uniram e um corpo foi de encontro ao outro em um grande e sublime abraço. Nessa hora, os corações começaram a bater no mesmo pulsar e ela disse: ” Cada dia que passei longe de você foram como um ano para mim. O brilho do sol não era o mesmo e quando chovia a terra não tinha o mesmo cheiro de terra molhada. ”
E, sutilmente, a resposta dada à bela moça foi: “Eu sabia que um dia você voltaria. Foram 1460 dias de sol e chuva sem nenhum arco-íris no céu. Agora posso enxergar no céu todas as cores do arco-íris.”
Os lábios se tocaram e aquelas almas, então, puderam ser novamente dois em um só.

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Estrelas, amores e partidas.

Só choro. Ela chorava e chorava e chorava. Não havia outro sabor em sua boca além do salgado das lágrimas e o amargo de seu coração. Era um amargo mais amargo do que chocolate 70% cacau e o salgado era mais salgado que bacalhau sem ter sido lavado.
A semana foi horrível. Logo no começo dela seus pais brigaram e o pai saiu de casa. No meio da noite ele saiu dirigindo e não atendia o celular por nada. Sua mãe chorava incontrolavelmente pois tinha perdido o amor de sua vida simplesmente por não dar conta de lidar com tantos anos de convívio. Seus irmãos acordaram com o barulho que o carro fez e queriam saber o que estava acontecendo.
E ela, que já estava acordada por não conseguir dormir desde a hora em que as luzes de toda a casa se apagaram, apenas fazia afagos carinhosos em seus dois irmãos mais novos e falava: “Tenham calma, meus amores. Papai foi comprar flores para enfeitar nosso jardim. Vocês viram como ele está ? Agora que o pé de manga está crescendo e os bicos de papagaio estão florescendo, precisamos de mais flores, não é verdade?” E então pôs aquele sorriso no rosto. Aquele que só ela sabia o quanto doía por dentro.
A cada movimento que seus músculos do rosto faziam para montar aquele sorriso forçado a sensação de dor de dedinho do pé sendo batido várias vezes na quina do sofá aumentava. Sabe aquela dor forte, chata, de punição por não ter prestado atenção por onde andava e ao mesmo tempo dor de punição pois podia ter feito algo para evitar, como por exemplo calçar-se? Então essa dor.
Assim que terminou de falar, seu irmão Zequinha, de 4 anos, questionou:
– Eliza, mas porque agora de madrugada? As flores estão dormindo. E se elas estão dormindo como é que o papai poderá vê-las abertas e sorrindo para decidir qual a mais bonita pro nosso jardim?
E o outro irmão, Marcos, de 6 anos prontamente respondeu: – É que agora a noite a luz da lua mostra a flor de um jeito que de dia a gente não consegue ver. Por exemplo, a noite com a luz da lua a gente consegue ver as estrelas e de dia não dá!
Dessa forma, os irmãos concordaram  e se contentaram com a resposta. Deitaram-se novamente pois no dia seguinte tinham aula cedo.
Como se o acontecido com os pais não fosse suficiente, a doce e sonhadora Eliza ainda teve outro contratempo no fim da semana: Seu melhor amigo estava indo embora…
Arthur e Eliza nasceram no mesmo dia. Suas mães se conheceram na maternidade e como eram ambas mães de primeira viagem, foram ao longo do tempo trocando experiências. Lelinha e Arthur cresceram juntos. Eles tinham uma casinha na árvore e um esconderijo secreto, compartilhavam do mesmo gosto musical e por incrível que pareça dava pra confundir a letra deles de tão parecidas que eram.
Pois bem, eles tinham um pelo outro mais que um amor de amigo que não chegava a ser amor de namorado. E era um amor diferente do amor de irmão. Eles brigavam tanto quanto irmãos brigam porém não conseguiam ficar sem se falar.
Eles se precisavam de verdade. Se precisavam tanto que Arthur rezava por ela antes de dormir e pedia pra Papai do Céu que os sonhos dela se realizassem porque se isso acontecesse ele ficaria feliz também. Do outro lado, ela fazia exatamente a mesma coisa! Só que nenhum dos dois sabia disso.
Eles se precisavam tanto, que Arthur aos 9 anos resolveu chamar Eliza de Lelinha porque disse que ela era a estrela do céu da vida dele (fazendo uma alusão a quando eram pequenos que ficavam contando estrelas no céu e não conseguiam falar estrelinhas, somente lelinhas). Depois desse dia, toda vez que eles iam contar estrelas- inclusive quando eles já estavam na adolescência- Arhtur sempre reiterava que Eliza era a estrela do céu da vida dele.
Eles se precisavam tanto que Lelinha não podia ver uma pedra com o formato mais arredondado na rua que lembrava o tanto que Arthur gostava de juntar pedrinhas para brincar de Três Marias; assim, ela andava olhando para o chão só para catar todas para ele. Colocava todas no bolso da mochila e no fim do dia tinha o maior prazer de entregar todas para Arthur e ver o brilho nos olhos dele.
Se precisavam tanto que quando um estava triste o outro sabia. Exemplo disso foi o dia que o cachorro do Tuts morreu (esse foi o apelido que Lelinha deu para Arthur porque quando era mais nova não dava conta de falar o nome dele todo). Lelinha estava na casa da Madrinha aprendendo a fazer chocolate quente e de repente sentiu um aperto no coração. Parou o que estava fazendo e falou: – Dinda, aconteceu alguma coisa com o Tuts.
Então a Dinda: -Ué, como assim? Você acabou de vir da casa dele.
– Eu sei, mas me deu um aperto assim no coração…- falou Lelinha colocando a mão direita com os punhos cerrados em cima do peito.
-Calma, bichinha. Não deve ser nada não. Mas se quiser, volta lá na casa dele. Essas coisas a gente não deve desrespeitar.
Lelinha foi o mais depressa possível para a casa de Tuts, que não era distante dali. Eles se encontraram no meio do caminho e a essa altura, Lelinha já estava chorando porque ela sabia com toda a certeza que algo tinha acontecido. Porém no momento que Tuts a avistou correu numa velocidade que nunca tinha corrido antes e só queria o abraço dela. Se abraçaram e choraram juntos, até o momento em que Arthur conseguiu contar que Conan tinha sido atropelado. Foi um dos dias que Lelinha mais se arrepiou em toda sua vida.
Agora tudo isso estava em ameaça. Arthur estava indo embora para outro continente com sua família. O pai dele conseguiu uma oferta de trabalho muito boa e não podia recusar, era a chance de dar a família tudo que não tinham tido até agora.
Depois do baque da notícia, Tuts foi ao encontro de Lelinha para contar-lhe a talvez boa talvez péssima novidade. Eles se encontraram embaixo da Marta, a árvore da casinha deles. Sentaram-se no chão e Tuts começou:
– Lelinha, tenho que te contar uma coisa.
– Hoje de manhã eu senti que você queria falar comigo. O que foi? Desembucha logo, sou curiosa!, falou Eliza totalmente animada sem saber o que a aguardava.
– Meu pai conseguiu uma promoção de trabalho, disse Arthur sem muito ânimo na voz.
-Que maravilhaaaaaaa! Mas qual o motivo de você estar tão pra baixo assim?
– É que vamos ter que nos mudar dentro de 1 mês.
-Pra onde? perguntou ela de forma mecânica, automática.
– Pra Austrália.
O silêncio que pairou no ar foi tão grande que o bater das asas de um beija flor que se aproximou podia ser ouvido.
Eliza estava tão perplexa que não sabia se seu coração tinha parado de bater, se estava batendo muito devagar ou se estava tão acelerado que não conseguia mais sentí-lo. Só sabia de uma coisa: estava sem chão, sem ar. Perderia seu companheiro de 18 anos de convivência. Perderia o presidente do clubinho secreto. Perderia o seu cantor e tocador de violão. Perderia o conselheiro sentimental. Perderia seu ombro, seu colo. Perderia as cores de seu arco-íris.
Enquanto Eliza permanecia em silêncio, Arthur só conseguia pensar que deixaria no Brasil o azul do seu céu, as notas musicais dos seus acordes, o toque de amadeirado do seu perfume e aquele cheiro bom de livro novo. Deixaria por aqui os vários filmes vistos e os poemas recitados em voz alta. Deixaria por aqui as pétalas do seu copo de leite (a flor predileta de Lelinha) e o pior, a deixaria aqui por não se sabe quanto tempo.
Depois dos 15 minutos mais longos de toda a vida dos dois, Eliza saiu do transe no qual se encontrava e chorando mais intensamente do que qualquer outro choro da sua vida, disse:
– Só me diz que nunca vai me esquecer. Que não vai deixar guardado numa gaveta tudo que já aconteceu. Me promete que vai lembrar de todas as brincadeiras e todas as brigas. Me promete que vai lembrar de todas as músicas e de todas as cartas escritas e das que queimamos também. Diz que não vai esquecer de todas as amoras verdes que comemos tentando não fazer careta e de todas as vezes que você me jogou na piscina e eu quis te matar porque não sei nadar. Promete também que toda vez que você for a uma montanha russa vai se lembrar que eu não tenho medo e do quanto você suava frio e segurava na minha mão.
Arthur olhava fixamente nos olhos de Eliza. Assim que ela terminou de falar entre soluços e suspiros de choro ele a abraçou e respondeu:
– Nunca esquecerei dos sonhos de doce de leite que dividíamos e das vezes que você caiu pulando corda e eu fui te ajudar rindo da sua cara. Não esquecerei daquele sorriso que você abriu quando fiz um gol de bicicleta na final dos jogos da escola. Lembrarei sempre de como você gosta de ir ao Zoológico apenas para ficar olhando os leões, as onças e os tigres e de como seu olhar fica encantado quando você entra no borboletário. Não esquecerei da nossa coleção de selos e cartões telefônicos usados e muito menos da primeira vez que você tentou se maquiar e ficou parecendo uma boneca inflável. Jamais esquecerei das bolinhas de gude que você me deu e das vezes que demos banho no Conan. Sempre lembrarei dos versos que escrevi e da dobradura em formato de coração que fiz para você. Guardarei todos os picolés de limão que tomamos juntos e todas as vezes que chupamos carambola na fazenda do meu avô. A maior prova de que você não sairá do meu coração é que toda vez que eu olhar para o céu e enxergar as estrelas, lembrarei da Estrela que faz o meu céu mais brilhante: você, minha Lelinha.
É incrível como dentro de um abraço o tempo passa mais rápido, né? E para Eliza e Arthur aquele abraço foi o mais intenso da vida deles. Quando se deram conta, já estava escurecendo e precisavam voltar para casa. Se olharam dentro dos olhos como nunca tinha sido feito antes e Eliza, com muito pesar no coração disse para Arthur:
-Tuts, preciso ir.
E pela primeira vez em 18 anos de amizade, os dois disseram aquelas três palavras em uníssono: ” Eu te amo.”
Eliza então, largou dos braços de seu amor-amigo e foi para casa.
Só choro. Ela chorava e chorava e chorava. Não havia outro sabor em sua boca além do salgado das lágrimas e o amargo de seu coração. Era um amargo mais amargo do que chocolate 70% cacau e o salgado era mais salgado que bacalhau sem ter sido lavado.

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Carta para Noel

Liverpool, 20 de dezembro de 2011,

Querido Noel,

Eu sei que fui uma boa menina durante todo o ano. Trabalhei e paguei minhas contas, irei passar a noite de Ano Novo sem nenhuma dívida. Ajudei o orfanato durante todo o ano. Sempre estava lá nos sábados pela manhã, brincava com as crianças, conversava, almoçava com elas e depois ia para o asilo dar banho nos meus velhinhos. Não que isso seja um troféu, na verdade é um grande prazer estar do lado dessas pessoas.

Eu sei que não posso reclamar de nada. De fato eu sinto saudades do pessoal de BH, faz 10 anos que me mudei pra Inglaterra mas, isso é parte da minha escolha. É que sabe, eu vou direto ao ponto e vou pedir o que eu quero de Natal. Não é nada muito difícil, mas é que para mim está sendo difícil de encontrar. Eu moro em AP consideravelmente grande. Tá, ele não é tão grande assim, mas pra eu morar sozinha?! É quase um palácio. E sabe… (eu definitivamente não sou boa em fazer pedidos)

OK!

EU PRECISO DE UM NAMORADO!

Pronto, falei!

Fala sério, Papai Noel?! Até você tem com quem conversar aí nesse gelo que você mora!Eu tenho muitos amigos por aqui. Mas já estou chegando nos 30 e a pressão sobre o assunto CASAMENTO aumenta a cada dia.

Sabe, seria ideal se eu conhecesse um brasileiro legal, bonito, de bom caráter e que morasse aqui em Liverpool. Mas eu acho que isso seria pedir demais. E um romance inglês… AH! Não seria tão ruim assim não é mesmo?!  E vamos combinar que os ingleses são suuuper bonitos!

Papai Noel, será que rola de eu ganhar esse presentão nesse Natal? Sim? Sim? Sim? Sim? Please?

I’ll be waiting!

Thanks!

See you in 5 days!

Kisses and Hugs!

Mary Jane

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